"A Polícia Federal prendeu ontem o presidente do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, Frederico Guilherme Pimentel, e outras seis pessoas -entre elas dois desembargadores e um juiz- suspeitas de participar de um esquema de venda de decisões judiciais.
Na ação, que mobilizou policiais da divisão de inteligência da PF em Brasília, foram presos dois advogados e a diretora de distribuição de processos do tribunal, além de um membro do Ministério Público, contra quem não havia mandado de prisão. Ele foi detido por porte de arma de uso restrito.
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Os detidos são suspeitos de fazer parte de um esquema que tinha advogados numa ponta e desembargadores em outra. Os advogados acertavam com clientes a compra das decisões do TJ e pagavam à chefe de distribuição para que os processos fossem encaminhados aos desembargadores da suposta quadrilha. Finalmente, os desembargadores julgavam as ações favoravelmente aos clientes dos advogados."
A distribuição é um dos elementos do processo que pouca gente presta atenção, mas que é fundamental para o bom andamento do processo e a imparcialidade das decisões.
A lei brasileira está baseada em um princípio chamado de "juiz natural". Este princípio estabelece que existe apenas um magistrado adequado para julgar cada caso. Uma ação criminal (homicídio, por exemplo) não pode ser julgada por uma vara de família (que trata de divórcios, separações etc). Se o juiz de família julgar a ação criminal, aquele processo estará contaminado porque ele não era o juiz natural para julgar aquela ação.
Mas nas grandes comarcas (capitais e cidades grandes do interior), bem como nos TJs, normalmente existe mais de uma vara (nas comarcas) e mais de uma turma (nos TJs) especializadas no mesmo assunto. Por exemplo, em Campinas existem 4 varas de sucessões, e cada uma delas tem um juiz diferente. Qualquer uma dessas varas pode julgar uma causa relativa a herança de alguém que morreu em Campinas. Mas isso não contradiz o principio do juiz natural que estabelece que ha apenas um único magistrado adequado para julgar determinada causa? Não. A razão de existir mais de uma vara sobre o mesmo tema é simples: o acumulo de processos. Uma única vara de sucessões não conseguiria lidar com todas as causas sucessórias de Campinas e, por isso, foram criadas outras três. O princípio do juiz natural diz que a ação devera ser julgada pela vara de sucessões de Campinas, mas não diz qual. Quando uma nova ação sucessória chega ao fórum de Campinas, existe um sorteio para saber em qual das 4 vara ela será julgada. Esse sorteio (chamado de "distribuição") acontece para evitar que quem entra com a ação possa escolher qual das 4 varas/magistrados irá julgar sua ação, mantendo, assim, a independência do judiciário e a impossibilidade de viciar a decisão.
Obviamente, se houve o comprometimento da distribuição das ações, os processos que foram afetados são imediatamente nulos, pois desrespeitaram o princípio básico da imparcialidade do judiciário.